domingo, 7 de dezembro de 2008

As portas da percepção

de Aldous Huxley

Livro de 1954, escrito por Aldous Huxley, onde o autor pormenoriza as suas experiências alucinatórias quando tomou mescalina. O título provém de uma citação de William Blake:
"If the doors of perception were cleansed everything would appear to man as it is, infinite."
"Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito."
Baseado nesta citação, Huxley assume que o cérebro humano filtra a realidade de modo a não permitir a passagem de todas as impressões e imagens que existem efectivamente. Se isso acontecesse, o processamento de tal quantidade de informação seria simplesmente insuportável. De acordo com esta visão das coisas, as drogas poderiam reduzir esse processo de filtragem, ou "abrir as portas da percepção", como é dito metaforicamente. Com o intuito de verificar esta teoria, Huxley começou a tomar mescalina e a descrever os seus pensamentos e sentimentos sob o efeito da droga. A sua principal impressão será a de que os objetos do nosso cotidiano perdem a sua funcionalidade, passando a existir "por si mesmos". O espaço e as dimensões tornam-se irrelevantes, parecendo que a percepção se alarga de uma forma espantosa e mesmo humilhante já que o ser humano se apercebe da sua incapacidade para fazer face a tantas impressões.

Mais de uma década depois de publicada, o título desta obra daria origem ao nome da banda The Doors, cuja música também foi inspirada por substâncias alucinógenas.
Um dos principais efeitos desses alucinógenos é a capacidade adquirida de se notar a conexão de coisas, pessoas ou acontecimentos aparentemente distantes. Se o leitor ou a leitora não estão entendendo o motivo ou o que inspirou este texto, talvez seja porque a suas portas não foram completamente abertas.

sábado, 8 de novembro de 2008

Explicações

Caros devoradores e devoradoras,

Tenho cá pra mim que devo desculpas e explicações a respeito da inatividade deste blogue. O senhor Tardin (Sleeping Dragon) e eu estudamos no curso de Letras da mesma universidade. E o final deste ano acadêmico está sendo muito corrido e atrabalhoado para ambos. Por isso a nossa ausência aqui. Mas logo o período de aulas termine, voltaremos a publicar nossos textos, demoradamente ruminados durante os últimos meses de silêncio.

Espero que sejam compreensíveis.

Cordialmente,

Vinícius "Elfo" Rennó

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

A hora e a vez de Machado de Assis

por Vinícius "Elfo" Rennó

Às quatro horas da madrugada do vigésimo nono dia de setrembro de 1908, há exatamente um século, faleceu aquele que foi e ainda é considerado um dos maiores escritores brasileiros: Machado de Assis. Uns o glorificaram, outros o repudiaram e há aqueles ainda que sequer souberam de sua existência. Ou, pelo menos, não sabiam até este ano, também marcado pelo centenário de nascimento de outro dos grandes das letras nacionais: Guimarães Rosa. Muita coisa foi dita e desdita a respeito das obras de ambos de lá pra cá.

Posso estar enganado, mas mesmo em Minas Gerais, pareceu-me que houve uma tendência a se falar mais do carioca do que do mineiro. Então me pergunto o porquê de haver uma maior comoção pelo Bruxo do Cosme Velho. Seria por conta da linguagem usada pelo autor do "Grande Sertão: Veredas", considerada cheia de obstáculos quase intransponíveis para alguns leitores, pois não encontram ali a língua escrita consagrada? Ou seria, talvez, por causa do fato de o autor de "Memórias Póstumas de Brás Cubas" ter vivido na então capital do país; um lugar de visibilidade? Não. Cada um usou a linguagem e o ambiente próprios de suas respectivas regiões e épocas para criarem suas histórias, que nem por isso deixam de ter o seu caráter universal. Então, por quê?

Creio que o principal motivo seria que a obra machadiana teve mais de um século para ser lida, relida, criticada, analisada e adaptada para outros gêneros e mídias, como, Cinema e Histórias em Quadrinhos. Ou seja, houve muita produção de mateiral a respeito. Não é que não tenha acontecido o mesmo à obra rosiana, contudo acho que ainda há muito o que se falar sobre esta e ainda não tivemos tempo suficiente para digerí-la por completo.

E, antes que haja qualquer briga, registro aqui meu recado aos dois imortais: Joaquim, não me leva a mal, gosto muito do sabor dos teus escritos - chego até mesmo a imitar-te na forma como preparo os meus -, porém eu prefiro a culinária mineira, com suas palavras bem cozidinhas. E, João, fica triste não, sô. Quem sabe não te darão maior atenção em 2067? quando for o TEU centenário de morte? O jeito é cada um esperar a sua hora e a sua vez.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Vivaldi e a Grande Peregrinação

por Bruno Tardin

Muitas pessoas acreditam que as coisas "ciclam". Assim como a lua tem seu ciclo de quatro etapas, a natureza tem um ciclo próprio, os animais, as plantas, o planeta, tudo, enfim. Mas isso é mais do que óbvio, vocês podem pensar... E é justamente por isso que decidi escrever algo sobre! Geralmente, o óbvio acaba se banalizando, e depois de certo tempo, nem é mais tão óbvio assim...
Como base para este texto, tomei por inspiração parte do grande legado que Mestre Vivaldi deixou-nos: uma de suas produções mais famosas e bem-apreciadas por muitos até hoje. Claro, refiro-me às Quatro Estações, que por questões de gosto pessoal e de conveniência tomei por minha fonte de inspiração. O gosto pessoal é uma resposta auto-explicativa. Já a conveniência, julgo no bom-senso e perícia de meus leitores para que descubram ao longo dessas linhas...
Haverei de seguir uma ordem não tão ortodoxa, com metáforas não tão nacionalistas. Isso porque, como muitos já sabem, os trópicos têm basicamente duas estações. Isso é refletido um pouco no nosso modo de agir. Somos um tanto extremistas em nossas ações e decisões, e somos pra lá de contraditórios em certos pontos do "ciclo". Não digo que todos fazemos isso, pois no próprio país temos regiões com as estações todas bem-definidas e mais ainda apreciadas. Mas este grupo é uma minoria, uma abençoada minoria que toma por constância o seu lema e faz da pessoalidade própria o seu estandarte. É impossível, eu sei, mudar o clima dos trópicos. E, a meu ver, não seria impossível (improvável, talvez, mas não impossível) mudar as pessoas.
Este foi um pequeno prelúdio, meus senhores. Os que me conhecem sabem que gosto de ir roendo-lhes as idéias pelas bordas, tal qual um rato desconfiado de que outro lhe cobiça o queijo (ou um daqueles matutos que sempre caricaturamos). Não hei de demorar-me mais e passarei ao que realmente interessa. Sem mais delongas... À primavera!
Para os que conhecem as obras (citadas acima) de Mestre Vivaldi, estes terão maior facilidade em receber a semente desta laudatória que redijo. A Primavera geralmente é taxada de estação do amor. Talvez não do amor, mas do nascimento. As flores surgem por todos os lados, pássaros festejam a beleza e o frescor da estação, a música flui em cada ponto colorido e resplandecente de vida. A primavera é uma estação que festeja ao sabor de uma valsa cheia de giros e rodopios, uma quebra de cintura e um aproximar-se de colos. Tudo é festa, a alegria é a ordem primeira. E no orvalho que beija cada flor a despertar, encontram-se vestígios de sonhos de paz e juras enamoradas.
Mas devemos lembrar também que outro ciclo existe dentro da própria primavera. O do dia – e da noite. E Mestre Vivaldi parece ter percebido este fenômeno com certa presteza e olhos de um sábio. As noites de primavera têm um quê de soluçar – sim, soluçar – tal qual a mulher que, vendo que chega a hora de separar-se de seu amor, agarra-lhe firme os braços e deseja que o tempo pare, e com isso venha a imortalidade daquela maravilhosa sensação... Mas, na primavera, este momento fúnebre e um tanto quanto melancólico, regido pelo soluçar do pobre rouxinol por um sonho perdido, dura pouco. Lá vem a manhã, com seus primeiros raios frescos e o orvalho que uma última vez beija suavemente as maçãs da terra. E toda a festa vai lentamente recomeçando, os ânimos voltam a se encher de merecido júbilo, e a cada minuto o baile da primavera recomeça seu próprio ciclo.
Nós também sofremos da mesma maleita que acomete a primavera. Nossa alma sofre de certa inconstância, oscilando entre um momento que beira o sublime e o leve chorar de uma criança que, tendo se perdido dos pais por um breve instante, crê piamente que aquele momento há de tornar-se eterno dentro de seu próprio sofrimento. Somos extremistas por natureza. Tal qual os discípulos de Jesus, com especial atenção para o bom e velho Pedro, que se num momento dizia que daria a vida por seu mestre, num súbito de paixão e devoção, no outro nega o alvo de suas afeições com certa frieza e distância. Somos facilmente iludidos pelo muito belo e rapidamente caímos nas sombras do muito lânguido. Uma hora nós estamos tirando mercadores do templo, na outra cochilamos enquanto Jesus chora suas emoções no que, sem sombra de dúvida, fora a maior e mais tocante melodia muda que este mundo já teve a audácia de presenciar.
Mas não temam, senhores: para aqueles que sabem onde olhar, o orvalho da noite e o canto da coruja são um mero piscar se comparadas à alegria vivida com a visita da aurora. Nossa alma, por mais que inconstante, almeja âncora segura que lhe garanta a felicidade. Os que confiam no Senhor são como as flores que, se encolhidas e temerosas durante a friagem da noite, revivem e reanimam ao primeiro saudar do sol.
Logo em seguida, o Verão: estação marcante, quente, sobejada com vapores noturnos e chuvas mais fortes. Quando o sol realmente mostra a vastidão de seu domínio e poderes sobre as criaturas que rastejam abaixo de si. Mas o verão não é um jugo, tampouco algo ruim. O verão é uma queima de fogos, é paixão ardente, é o "Eu te amo" pronunciado à donzela que passa na distância, é o olhar confiante para o horizonte que desejamos com nossas mãos e invejamos com nossa alma. É uma xícara de café quente na varanda, é um beijo roubado, é alegria febril, um lampejo de genialidade que passa pelos olhos e deixa um rastro de lágrimas de orgulho e surpresa.
Mas, como eu disse, o verão também traz suas chuvas. Suas noites, ao contrário da primavera, são tão fogosas e intensas quando as manhãs. Os calores que o sol lança sobre a terra duram enquanto a estação durar. Mas as chuvas têm um poder de neutralizá-lo, suprimi-lo e drenar os frutos de seu labor passionatto. Um momento gélido, um tremer de ossos, um olhar triste para as plúmbeas nuvens que se estendem ao infinito, roubando de nós o horizonte tão desejado. Nossa alma chora juntamente com as nuvens. Nosso espírito escurece tal qual o firmamento sobre nós. Nosso coração se silencia ante a sonata dos pingos de chuva.
O verão é uma estação de amadurecimento. Tanto por coisas boas, quanto pelas não-agradáveis, e estas são as que mais deixam marcas. Todo aprendizado requer sofrimento, todo sofrimento é um educador nato (com melhor didática do que a felicidade, quer queiram, quer não). E, para Mestre Vivaldi, as gotas de chuva acabam durando mais do que a escuridão primaveril, e são as arautas de tão áurea estação. "O verão é prenunciado por tempestades", ensina-nos sua música. Tal qual outro mestre, deveras anterior a este: Saulo, que depois das tempestades pela qual peregrinava, e depois de vislumbrar o sol de verão que era a presença de Deus em Jesus, o horizonte que o homem procurava com um misto de fúria e curiosidade. A cegueira de Saulo (que teria seu nome alterado para Paulo) foi o epílogo das tormentas de seu espírito. O sol raiou-lhe com tanta força que, por breves momentos, roubou-lhe a visão. E nunca mais deixou-o sob a chuva novamente. Breves nuvens eventualmente cobririam o sol, isso é fato. Mas ele sempre estaria lá, alumiando e guiando os passos vacilantes e desconfiados daquele que seria um dos mais renomados defensores e amantes (no sentido literal da palavra) do cristianismo.
Muitos não notam, mas o verão carrega uma nota de imperiosa urgência e subliminar angústia. Não por causa de suas tormentas, elas entristecem e obscurecem, mas não são tão discretas e sugestivas assim. O verão carrega consigo uma marca de funesta preocupação, tal qual nós próprios. Passou-se a primavera e suas delícias. Passa o verão e sua tempestuosa maré de emoções fortes e explosivas. E aproxima-se aquela que é mensageira de futuros temores e agruras.
Nós temos uma facilidade tremenda por nos deixarmos levar, como se estivéssemos bêbados da aura de verão. Somos tempestuosos e intensos, e geralmente nos rendemos facilmente às tempestades da vida. Mestre Vivaldi desconfiava deste lado enérgico da natureza humana, e não foi à toa que construiu seu "Verão" da maneira que o fez. Uma marcha rumo ao horizonte, uma paliçada de tormentas no caminho. E o hálito morno e assustadoramente próximo das estações que ainda restam... Se você entende o que eu digo, entende também a melodia a que me refiro. E com ela se identifica... O verão, senhores, termina numa nota arrastada e grave.
Ao contrário do que muitos pensam, o Outono é extremamente agitado. Ao menos, inicialmente. As folhas das árvores, coradas de tanto amar ao longo de duas estações, rendem-se ao seu lânguido descanso e traçam uma última valsa do galho de suas moradas até o chão que esfria lenta e mortalmente. As árvores despem de sua lustrosa roupagem e encarnam os camponeses do velho mundo: simples, desnudos e sem muito atrativo. Os pássaros voam para longe, e os que assim não agem preparam-se para em breve fazê-lo. Os frutos atravessam as últimas etapas de seu amadurecimento e esperam ansiosos por mão que os colha.
E então, o vento: o ressonar das almas que minguaram entre o verão e a atual estação, um prelúdio assustadoramente próximo de uma noite que será mais longa e marcante que o dia. Mesmo sendo interrompida, ela deixará presença. As noites do Outono de Mestre Vivaldi também eram mais longas e marcantes, recortadas pela valsa das folhas que caíam durante o dia. E o frio se aproximando, como as asas da morte fazem quando sentem um espírito que evanesce. O calor também evanesce, a beleza, tudo o mais que era belo e apetecível.
De acordo com o Dalai Lama, outro grande Mestre em sua própria arte (a arte de moldar espíritos de homens): "Uma árvore em flor fica despida no outono. A beleza transforma-se em feiúra, a juventude em velhice e o erro em virtude. Nada fica sempre igual e nada existe realmente. Portanto, as aparências e o vazio existem simultaneamente". Não poderia ter dito melhor, verbalizando em palavras o que Mestre Vivaldi dissera com acordes. O outono é uma estação de lenta degradação da beleza, da juventude, da superficialidade. Mas os frutos maturam. Tal qual certo jovem que também teve seu nome trocado no momento final de sua metamorfose: ao sair da pupa, após ter batalhado com seus próprios sonhos (e saído vitorioso, ainda que escoriado), Jacó mudou para Israel, nome que seria imortalizado futuramente.
E depois de muito tempo de longo e merecido modelamento, depois que suas folhas de ignomínia e esnobe superioridade caíram todas por terra, restaram somente os frutos de sabedoria e autocontrole, de reconciliação e amor verdadeiro. E assim ele transpôs o Vau de Jaboque acompanhado das últimas notas que futuramente Mestre Vivaldi comporia, uma última despedida das folhas rubras como sangue e ariscas como cervos numa campina. Um despedir-se destes raios mornos do sol e deste frescor agradável da brisa de outono, os últimos tons de febril complacência se despendem num evanescente crepúsculo.
Nós somos uma árvore no outono, a estação de maturamento. Somos constantemente trabalhados, constantemente desenvolvidos, até que chega o momento em que o excesso deve partir, e devemos provar dos frutos que de nós vieram. Devemos nos preparar, pois num dado momento do ciclo de nossas vidas (tal qual no ciclo das estações) muito do que julgávamos belo e prazeroso cairá por terra, e teremos somente consigo o que de nós brotou.
E então, o fim. As brancas lágrimas que o céu lança sobre nossos corações são a abertura desta ópera que, futuramente, mostrará ser tocante tragédia grega. A música de Mestre Vivaldi para esta estação parece bailar ao longo da neve que cai do céu. Tudo cai em sonolência inerte, tudo adormece. A neve cobre a tudo como gélida mortalha. Nossos espíritos são ofuscados com as brumas geladas, nossos corações entram em vagarosa sintonia com a aura moribunda que esta estação traz. Mas o Inverno não tem nada de mórbido, ou triste, pelo contrário. Mestre Vivaldi também assim pensava, pois sua melodia só começa vagarosa e triste, e evolui para algo que poderia ser comparado somente às crianças que brincam numa rua e, ao pôr-do-sol, adormecem embaladas por cobertas e amor de mãe.
Hayley Westenra canta a beleza e a real intenção do inverno em sua música "River of Dreams", inspirada e adaptada da melodia original de Mestre Vivaldi. Transcrevo aqui somente a tradução do trecho que notadamente resume aquilo que eu tento escrever, e que aquele que compôs minha musa inspiradora conta em acordes, feitos nos tempos de outrora:
"Rio dos sonhos, leve-me com você esta noite
Deitada em seus braços seguimos à deriva
Para ilhas da imaginação que brilham e fulguram
Sob as estrelas
Enquanto deslizamos através das trevas
Para o coração da noite".
O inverno é o tapete carmesim que nos prepara e purifica através da mortificação lenta e gradativa para o renascer que teremos quando, à medida que a neve descobre e revela nossa nova forma, reavivamos ante o chamado da Primavera.
Nós, enquanto filhos do Deus vivo, somos os peregrinos das quatro estações, perscrutadores do legado de Mestre Vivaldi. Somos uma profusão de primaveras e verões e outonos e invernos a rodopiar no caldeirão de nossas almas, uma aberração da natureza e uma obra única e tão bela e bem trabalhada que beira a plenitude do divino (o mesmo que nos forjou de seu amor e alegria). E temos como último inverno, um terrível e amargo inverno, as etapas finais de nossa vida nesta terra, esperando que a salvação do Deus Altíssimo venha despertar em nós uma primavera perfeita e infinita, onde não será necessária a tempestuosa fúria educadora do verão nem a metamorfose fria e destruidora do outono. O sangue que Cristo verteu no madeiro é a rosa que abre festiva na primavera, é o sol a brilhar no verão, e é o carmesim a derrubar as folhas do outono. E seu retorno triunfal há de ser precedido pela última lágrima gelada a ser velada por este mundo...
A marcha das estações... Ou melhor, a nossa marcha pelas estações de nossas vidas... Vivenciando, sorvendo, se deleitando, sofrendo, e aprendendo, sempre aprendendo e crescendo, sempre, como um carvalho que almeja roçar as alturas... Tendo por promessa os palácios das sendas celestiais, apoiados pelo legado do Messias e daqueles que foram tocados pelas mãos do Pai... E sempre valsando ao ritmo da orquestra de Mestre Vivaldi. Peregrinamos rumo à primavera eterna na qual nossas almas vão, enfim, conhecer por inteiro aquilo que só viam em parte. A maturação de nosso espírito através da foice da morte, que arranca as folhas secas de nosso corpo e purifica-nos para, puros e sem mácula, retornarmos aos campos floridos do jardim onde primavera, verão, outono e inverno tornam-se uma única estação... Que ecoa e ressona de acordo com o coração daquele que tudo criou. A estação da suprema graça de Deus.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Já faz um ano...

por Vinícius "Elfo" Rennó

Sim, leitoras e leitores, há exatamente um ano este blogue foi criado. De lá pra cá muita coisa mudou por aqui, mesmo que sutilmente. Acredite, houveram mudanças tanto na forma como conteúdo.

Antes de mais nada, gostaria de anuncia que, pouco antes do aniversário do Devorador, convidei um amigo para também ser um cozinheiro escritor aqui (que aceitou de bom grado e já começou marcando presença, visto o último post). De agora em diante, o autor de O Despertar de um Sonho me ajudará a falar sobre nossas degustações literárias, dentro e fora da academia. Por isso peço para que dêem as boas vindas ao Bruno Tardin.

Como podem ver, a principal mudança está na intenção de que este seja um blogue colaborativo. Quem estiver interessado em integrar à equipe ou simplesmente divulgar a sua impressão sobre algum livro, basta conversar conosco via email ou comentários e veremos o que fazer. Trata-se de uma nova fase, com novas possibilidades.

Pois que venha mais um ano!

domingo, 17 de agosto de 2008

Páprica

por Bruno Tardin

Na maioria das vezes, as metáforas mais esquisitas são as mais verdadeiras. Obviamente, não procuro, através deste ditado tão estranho quanto obscuro, escusar (ou até mesmo justificar) o que vou escrever. Não, caro leitor, não pretendo isso: só tomei a frase como um bom prólogo para esta pequena crônica.
Em se falando de metáforas, aqui vai a minha (esta pequena semente que planto nos corações dos meus leitores queridos, e que gostaria de vê-la frutificar algum dia): o mundo, meus caros, é uma grande e suntuosa cozinha.
Explico-me: todas as estruturas, recôncavos e membros da sociedade moderna como nós a conhecemos, todos tem um papel análogo a certos componentes básicos em uma cozinha. Existem aqueles que são panelas, talvez não tão atrativos à primeira vista, nem tão bem tratados, mas vitais para o processo de amadurecimento e preparação do alimento. Podes crer, leitor, que este gênero de indivíduo não seja tão importante assim: tente comer um belo pernil cru, ou uma boa porção de arroz, sem que este tenha passado pelo milagre da fervura em água, e você entenderá o que digo.
Existem também aqueles que estão situados na área de limpeza: palhas de aço, detergentes, uma boa barra de sabão (aquele feito com gordura e outros componentes menos célebres, todos depois de muito tempo de diálogo em uma panela fervente)… Um gênero tanto obscuro quanto necessário: ninguém gosta de limpar a sujeira dos outros (e uso aqui o sentido literal de “sujeira”), mas é um trabalho necessário e alguém tem de fazê-lo.
Poderia demorar-me muito mais em outros vários gêneros, mas deixo este trabalho saboroso para algum outro irmão de penas (ainda que esteja digitando este texto, mas tudo bem…). O gênero que pretendo retratar aqui é aquele que, usualmente, só vê a luz do dia durante a salada, e algumas vezes durante os preparativos das refeições: temperos.
Creio que não é necessário demorar-me para explicar a importância deste conjunto diminuto em estatura e gigantesco em importância; tente imaginar sua vida, toda a sua arrastada existência, leitor, sem uma pitadinha de sal. Não, não estou fazendo graça dos hipertensos: tenho é muita pena deles, pois uma das maiores dádivas lhes foi consequentemente negada (que me perdoem os médicos, mas isto é verdade).
Mas há ainda uma subdivisão no reino dos temperos, que deve ser explicada: os temperos vitais e as salsinhas. Tomem por “salsinha” a classificação de mestre Veríssimo, de que isto seria todo e qualquer componente presente na comida com efeito puramente ilustrativo: desde a literal salsinha presente em alguns pratos frios, até aquele brotinho de canela coroando os doces de festa.
Até mesmo as salsinhas têm sua utilidade: apesar de não serem temperos consideravelmente marcantes, são uma espécie de “merchandising” para os alimentos nos quais se encontram. Uma função não menos nobre que invejável, já que são elas que irão garantir uma boa propaganda do produto que vendem. Contudo, não é este o grupo que mais me agrada, e tampouco terá ele aqui futuras dissertações.
Os temperos vitais, como o próprio nome nos faz o favor de dizer, são de extrema importância: dão um toque extra ao sabor, uma coloração mais viva e divertida, às vezes… Enfim, enriquecem a própria alma do alimento. E, como o próprio Messias nos diz através das Santas Escrituras, nós devemos ser o sal da terra. Obviamente, ignoro qualquer sentido literalmente agrário que a citação possa ter.
Saindo do campo metafórico e passando ao ideal platônico (resumindo, trocando em miúdos tudo isso aí): nosso papel, querido leitor, não é somente ficarmos guardados num frasquinho de vidro temperando as saladas e porções de comida servidas vez ou outra. Se pudesse, faria uma adição às palavras de Jesus, mesmo que o termo por ele usado fosse simples o bastante para ser entendido à sua própria época: sejamos o sal, a pimenta-do-reino, a mostarda (a boa e velha mostarda, amiga de outras parábolas), a noz-moscada, enfim, sejamos o tempero da terra.
Devemos nos valer de nossas propriedades “temperísticas” e dar um pouco mais de sabor a este mundo cinza e sem graça no qual vivemos. Outra grande lição que podemos ministrar: paciência. Afinal, quem já ouviu falar de um grande cozinheiro que temperasse seus pratos visando algum recorde bizarro no Guiness? O bom tempero leva tempo e concentração para fazer efeito, leitor: por isso mesmo é que você, pequena páprica, deve ter paciência. Os frutos de seu labor só serão percebidos durante o processo de degustação. Mas tome cuidado: a nossa missão pode acabar sendo uma verdadeira espada de dois gumes.
Não é à toa que inventaram o adjetivo “temperança” (e naturalmente, com ele seu análogo, “intemperança”): equilibrar, colocar sobre limites. Afinal, em ausência, nosso trabalho é praticamente inútil (os hipertensos que o digam). Mas em excesso… Bom, basta imaginar o que seria aquela feijoada feita por uma cozinheira que pesou a mão na hora de salgar os componentes porcinos, ou então aquela avó ditosa que, por puro descuido, usa um pouco mais de pimenta do que o necessário em suas criações culinárias. Nós devemos ser temperados, se quisermos também temperar. Pode parecer fácil, mas tente ser “somente o necessário” num mundo materialista e tresloucadamente individualista como o nosso, e você vai ver que as coisas não são tão doces como você queria…
Falta-me espaço e sobram-me idéias, por isso hei de dar cabo desta pequena cria de meus miolos sem mais delongas: sejam o tempero da terra, meus amigos. Sejam moderados e equilibrados, mas tenham certeza de que essa humilde participação em nossa sociedade realmente faça a diferença. Dêem mais cor, dêem mais sabor, dêem um cheiro melhor nas pessoas cruas e sem tempero deste mundo (esta é também uma deixa para as pessoas-panelas, das quais falei anteriormente). Lembrem-se de que, por mais que seus esforços possam parecer inúteis a vocês próprios, sua utilidade não é para vocês mesmos, mas sim para os outros. E de que, se tudo o mais parecer inútil, nós estamos sendo usados por um grande, sábio e todo-poderoso cozinheiro, que sabe muito bem o que faz (afinal, não se pode ensinar um chef de renome como fazer uma omelete).
Confiem nestas mãos ditosas e experientes que nos usam, leitor, e tenha fé em sua própria capacidade: afinal, os temperos não são somente para enfeitar a mesa das saladas. Sejamos temperados e temperamo-nos uns aos outros, para que nosso eterno junta-panelas de domingo (que é a vida em sociedade) seja mais do que uma gororoba qualquer. Sejamos diferentes, e façamos a diferença. Pápricas de todo mundo, uni-vos!

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Deuses Americanos

Deuses Americanos, de Neil Gaiman
Escritor inglês atualmente morando nos Estados Unidos, Neil Gaiman é mundialmente conhecido como o autor da série de histórias em quadrinhos The Sandman. Mas além de HQs, ele também trabalha na criação de filmes, peças de teatro e vários romances de Ficção Científica e de Fantasia, que é o caso da obra sobre a qual falerei hoje.

Libertado da prisão, Shadow encontra o seu mundo virado de cabeça para baixo. Sua esposa foi morta, um misterioso estranho oferece-lhe um emprego. Mas este estranho, o Sr. Wednesday, que parece saber mais sobre Shadow do que é seria possível, e o adverte que uma tempestade está vindo -- uma batalha pela própria alma da América... e eles estão indo diretamente a seu caminho.

Uma dos livros mais falados do novo milenio, Deuses Americanos (American Gods, no original) é uma caleidoscópica viagem dentro da mitologia e através da paisagem americana, ao mesmo tempo familiar e totalmente estranha. É, simplesmente, uma obra-prima contemporânea. Devorei-a em uma semana, tamanho o seu sabor agradável e viciante.

Àquelas pessoas que não têm dinheiro para comprar este livro ou não o encontraram em uma biblioteca, eu digo para não se alarmarem, pois podem baixá-lo pela internet. Aviso que esta versão que encontrei foi traduzida para o português por fãs, portanto não é das melhores. Mas, tirando os erros tipográficos, é possível lê-la tranqüilamente.

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PS: Esqueci de dizer que o Neil Gaiman esteve há pouco mais de um mês no Brasil, participando da FLIP. Onde ele foi muito bem recebido e autografou os livros de muitos fãs. Para quem perdeu, segue um consolo no qual ele lê um conto seu:

domingo, 27 de julho de 2008

Estado Policial no futuro da Internet Brasileira?


Um excelente post de Luciana Monte, no blog Dia de Folga, explica em que pé está a Lei Azeredo para Cibercrimes.

Faço aqui uma pequena citação do texto dela:
"Boa parte do que está sendo dito pela web com referência ao projeto de lei de cibercrimes está ultrapassada. O texto do Abaixo-assinado pelo veto do projeto de lei de cibercrimes, aliás, está ultrapassado, já que suscita questões que não são mais problema, como o armazenamento temporário de informações no computador que é feito sempre que se navega na internet.

O que restou de realmente problemático?

  • Criminalização de condutas usuais e de boa-fé, como o envio de email para uma lista enorme e visível de contatos.

  • Criminalização de condutas sobre as quais o autor não tem controle, como a disseminação de códigos maliciosos.

  • Agravamento desses crimes pelo simples uso de nicknames (apelidos), prática habitual na web, e diga-se de passagem, na vida offline também.

  • Possibilidade de criminalização pela interrupção de serviços online ou de acesso à internet, matéria que deveria ser tratada no âmbito civil, não penal.

  • Possível inviabilização de redes sem fio (wi-fi) e comprometimento de outras redes, como as de cibercafés e lan houses.

  • Brecha para futuro regulamento "big brother".

Temos todo o direito de continuar reclamando do projeto de lei de cibercrimes. Devemos, mesmo, protestar, pressionando deputados para que rejeitem dispositivos que trarão graves prejuízos aos usuários de computador. Razões para a mobilização, existem.

Protestemos, no entanto, com embasamento e pelos motivos reais. O "ouvi dizer" está gerando muita confusão sobre o tema e desviando o foco dos defeitos concretos do projeto."

Julgo que, crime mesmo seria negar o acesso à informação, à arte e à cultura em geral que a Santa-Internet nos dá.

sábado, 17 de maio de 2008

Causo na Vila das Letras

por Vinícius Rennó

-Cumpadi, acabo di sabê dum causo qui conteceu ontem di noite.
-Uai, que houve? Diga logo duma vez, sô.
-Oia pro cê vê. Arrancaro as bola do Seu Alves!
-Sassinhora! Quem foi que castrô Alves?!
-Me dissero qui foi o português caolho, o tal do Seu Camões.
-Mas comé quisso foi aconticê?
-Parece que o homi pegô a propria muié, Dona Florbela, com o otro na cama. Então foi correno até a casa do vizinho pegar o machado emprestado. O resto ocê pode imaginá.
-Caramba!
-Agora o Seu Alves tá lá no hospitar.
-Coitado... Mas aqui, o vizinho sabia pra quê o português queria o machado?
-Ôh se sabia! Seu Assis tem muito apego à suas coisa, num sabe? Mas sabeno o motivo do português, Seu Assis entregô o machado na hora. Parece que ele num adimite essas desavergonhice de jeito nium.
-Eita! E Dona Florbela? quê se assucedeu cum ela?
-Nessas hora deve di tá pedindo perdão pro marido, que num qué vê ela nem pintada.
-Se fosse comigo, eu não perdoava.
-Nem eu. Mas sabe como é o português, se deixa levá pelas palavra doce da muié.
-Então, ocê acha qui eles vão acabá vortando junto? Povo doido, sô.
-Pois é.

terça-feira, 29 de abril de 2008

O Noviço

de Luís Carlos Martins Pena

Ainda me lembro da primeira vez que tive de ler este livro, quando ainda estava no início do colegial (atual ensino médio). Foi tão forçoso que pequei desgosto pela obra. Um pouco mais tarde pude assistir à encenação desta peça teatral, o que mudou completamente minha opinião a respeito, tamanho o empenho dos atores. Agora que estou na universidade e tenho que lê-la novamente, a fim de estudar os começos do Romantismo no Brasil, não mais acho ruim. Pelo contrário, dá-me gosto relembrar das cenas de humor simples e críticas, em que as graças e desventuras da sociedade brasileira e de suas instituições foram tão bem retratadas.

Basicamente, esta é a história de Carlos, rapaz endiabrado, que é enviado a um convento por decisão de sua tia e tutora. Não tendo vocação para a vida religiosa, Carlos foge do convento e dedica-se a desmascarar o ambicioso Ambrósio, segundo marido de sua tia. Para saber mais, só lendo (ou ouvindo) "O Noviço" na BibVirt.

Quanto ao autor, Martins Pena é considerado o fundador da comédia de costumes no teatro brasileiro, um dos principais precursores do Romantismo no Brasil e um dos primeiros autores a retratar o processo de urbanização no século XIX. Suas obras, apesar de ficções, servem como fontes históricas dos costumes e da linguagem coloquial da época.

domingo, 27 de abril de 2008

Livros livres

Descobri um sítio muito interessante onde se pode fazer a leitura integral e gratuita de uma "vasta quantidade de informação qualificada", tanto para a pesquisa acadêmica ou escolar quanto para o simples prazer de se degustar literatura. A Biblioteca Virtual do Estudante de Língua Portuguesa, projeto criado pela parceria entre a AT&T Foundation e a Escola do Futuro da USP, compreende não apenas textos por escrito, mas também textos falados para cegos (de obras tão extensas quanto Os Lusíadas, por exemplo), além de imagens, sons e vídeos diversos. Portanto, podem se deliciar à vontade:

http://www.bibvirt.futuro.usp.br/


Ah! E sempre dêem uma olhada na coluna Dieta de Links, à direita, pois constantemente acrescento blogues e sítios bons para a saúde mental de seus leitores.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Língua vs. Gramática

Há pouco, participei de uma discussão muito interessante na faculdade. Na aula de Leitura e Produção de Textos, o professor (substituto, mas não menos qualificado do que a professora efetiva) nos questionou a respeito das gramáticas. Enquanto os livros de biologia, por exemplo, descrevem os seres vivos, por que a maioria dos livros de gramática prescreve como devemos falar ou escrever? A língua comumente usada pela maioria das pessoas no cotidiano é muito diferente daquilo que se vê como norma padrão. Veja bem, o problema não é a norma padrão em si, mas a forma culturalmente mutiladora como ela é ensinada nas escolas atualmente: o indivíduo que vive em um meio mais simples, infelizmente, cresce achando que o jeito que ele, sua família e as pessoas de sua comunidade falam é "errado"; como se devesse esquecer toda a sua linguagem popular e engolir, sem mastigar, aquelas regras de conjunção e concordância ditadas por uma minoria elitizada e preconceituosa. Não digo que o ensino da norma padrão da língua não seja importante, muito pelo contrário. Porém este ensino precisa ser feito de forma que adicione mais um estilo ao conhecimento lingüístico, e não de forma que substitua o "errado" pelo "certo". Pois, dependendo do contexto social no qual o indivíduo se encontra, este terá que adequar a sua fala ou a sua escrita às circunstâncias de seu uso.

Para simplificar, imagine que a língua seja um carro o qual quero dirigir e que a gramática seja seu motor. De nada me adiantará saber qual a função de cada uma de suas peças se eu não souber como pilotá-lo. Afinal, minha pretensão é apenas ser um bom motorista e não um técnico mecânico!

sexta-feira, 7 de março de 2008

Portugal dá Aval à Reforma Ortográfica

Fonte: UOL
O fim do trema em todo o vocabulário e de acentos em palavras como "vôo", "idéia" e "lêem" ficou mais próximo ontem, com a decisão do conselho de ministros de Portugal de aderir ao acordo ortográfico entre os países de língua portuguesa firmado em 1991.

A ratificação do texto pelo país depende ainda da aprovação pelo Parlamento da proposta elaborada pelos ministros. Se passar pelo Legislativo, o texto será submetido ainda ao presidente da República. Mas, segundo declarou à agência Lusa o ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, "com a decisão agora tomada, o governo português está a exprimir a sua vontade política de se juntar aos outros Estados da CPLP".

No Brasil, o acordo ortográfico já foi aprovado pelo Congresso e, em tese, está em vigor, uma vez que, para isso, basta a assinatura de três países da CPLP. Além do Brasil, já ratificaram o texto Cabo Verde e São Tomé e Príncipe.

A implantação, porém, era adiada devido à não-adesão de Portugal. "Os países todos esperam Portugal, até porque se trata do país matriz do português", disse à Folha Luís Fonseca, secretário-executivo da CPLP. "Senão, estaríamos em uma situação bizarra de o acordo nos levar a três ortografias."

Os ministros portugueses estimam um prazo de seis anos para a implementação das mudanças. No Brasil, pode estar presente nos livros didáticos já daqui a dois anos.

O MEC disse ontem que o ministro Fernando Haddad se reunirá com representantes do Ministério da Educação português para definir um cronograma de implantação gradual.

Ainda não há um cronograma para a alteração das regras em outros escritos, como dicionários e obras literárias, afirma Nazaré Pedrosa, assessora internacional do Ministério da Cultura. "A adoção de uma nova ortografia tem de se dar de uma forma normal, não impositiva nem dramática."

Professores terão de ser treinados para ensinar as alterações, e todos terão de reaprender a ortografia, mas, para ela, não é preciso criar "alarme", já que, argumenta, todos se adaptaram à reforma de 1971. A reforma também será vantajosa, diz, para a adoção do português como língua de trabalho em organismos internacionais.


Quanto a minha opinião a respeito, creio que a língua ficará como que sem graça, visualmente falando. Gosto de por o trema nas "lingüiças" e nos "pingüins" e de acentuar as minhas "idéias" e os meus "vôos" de imaginação. Mesmo sabendo que estas mudanças trarão muitas vantagens para a comunicação entre os países lusófonos, parece-me que perderemos mais do que ganharemos com esta reforma, que futuramente poderá ser considerada "ex-trema".

terça-feira, 4 de março de 2008

E agora, Gregório?

de Leonardo Bursztyn (Móveis Coloniais de Acaju)
Quando acordou, Gregório Samsoniti
Tinha se tornado um horrível sanduíche
De frango compactado
De frango com aliche

Nem em seus mais terríveis pesadelos
Tinha picles no lugar dos cotovelos
E justo ele
Que tinha um futuro promissor
Como herdeiro de uma gigante do setor
De bolsas, malas e maletas

E agora, Gregório?
Não vou poder comparecer a seu velório
Não vou poder comparecer
E agora, Gregório
Não vou poder comparecer a seu velório
Não vou poder comparecer
Que final mais inglório
Numa lixeira de praça
Uma lixeira de praça
Praça de alimentação
Praça de alimentação

O caso de Gregório não foi isolado
Era sanduba de bacana pra todo lado
Se é bom pra você
Imagine pra mim
Ver o seu deputado devorado
Com alface e gergelim

Quem era foda
Se food
Quem era foda
Se food
Acabou-se a mamata

Seu Nestor
Celebrando
O fim da mamata
Seu Nestor e os incríveis previdenciários
Celebrando
O fim da mamata
Fazendo referência tanto ao poema "José", de Drummond, quanto ao livro A Metamorfose, de Kafka, esta música é literatura pura em forma de uma melodia alegre e divertida. Para conhecer mais do trabalho artístico dos autores desta "Metamorfossa", acesse o site oficial da banda.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio

de Fernando António Nogueira Pessoa

Ouça este poema de Ricardo Reis, recitado por Paulo Autran:

Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas. 
        (Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
        Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
        E sem desassosegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
        E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranqüilamente, pensando que podiamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
        Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente nao cremos em nada,
        Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-as de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
        Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
        Pagã triste e com flores no regaço.

Considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa, Fernando Pessoa é foi, sem dúvida, um dos mais representativos, senão o maior, poeta português do século XX. Por ter vivido a maior parte de sua juventude na África do Sul, a língua inglesa também possui destaque em sua vida.

Teve uma vida discreta, em que atuou no jornalismo, na publicidade, no comércio e, principalmente, na literatura, onde se desdobrou em várias outras personalidades conhecidas como heterônimos. A figura enigmática em que se tornou movimenta grande parte dos estudos sobre sua vida e obra, além do fato de ser o maior autor da heteronímia.

Mas, afinal de contas, o que esta pessoa tão especial nos deixou de importante? Só sei que foi grande, grande Pessoa.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

O Pequeno Príncipe

de Antoine de Saint-Exupéry

O Pequeno PríncipeParecendo ser apenas um doce para crianças, na verdade O Pequeno Príncipe se tra de uma refeição completa para todas as idades. Aliás, "não é um livro para crianças, porque traz justamente a mensagem da infância, a mensagem da criança. Essa criança que irromperá de repente no deserto do teu coração, a milhas e milhas de qualquer região habitada". É um livro para aqueles adultos sérios que não mais compreendem as coisas que realmente importam na vida.

Devorei-o em menos de uma tarde, tão interessante é. Para poucos e raros, será esta indicação como que um presente divino. Para muitos, parecerá apenas um livro infantil e bobo. Mas a raposa, que nele se encontra, adverte: "... só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos."