terça-feira, 24 de março de 2009

Sidarta

de Hermann Hesse

"Om: 'o presente, o passado e o futuro'. É, segundo o upanixade de Manduquia, o mundo inteiro, expressado por uma única sílaba, e ainda tudo quanto pode existir fora dos mencionados três tempos. (...)". Logo nesta primeira nota de rodapé, da versão brasileira do livro, já se encontra toda sua essência. Mas, como o próprio personagem-título ensina (ou, pelo menos, como EU aprendi de sua filosofia), não é possível obter a sabedoria através de doutrinas ou mestres, senão da própria experiência de vida. Portanto, não perca teu tempo, caro leitor ou querida leitora, lendo o que eu escrevi sobre esta magnífica obra de Herman Hesse e vá diretamente à fonte. Se bem que, segundo esta fonte, o tempo não existe; tudo é uma coisa só. Então não importa se lerás ou não o meu texto. Mas já que leste até aqui, não vejo motivo para desistir agora.

"Sidarta" não fala da história do Saquiamuni, o Buda, mas de um pesonagem diferente, que teve origem e início de vida muito parecidas com as do Iluminado. Este até aparece durante a narração, mas como personagem secundário, só para ter sua doutrina criticada respeitosamente pelo protagonista. Quando este se encontra pela última vez com seu amigo de infância, Govinda, diz-lhe, a respeito do Buda, que "o gesto da sua mão me importa mais do que as suas opiniões. Não é nos seus discursos e nas suas idéias que se me depara a sua grandeza, senão unicamente nos seus atos e na sua vida". Enfim, isso mostra que Hesse faz uma interpretação pessoal das correntes filosóficas orientais.

Creio que já disse o bastante -- ou mesmo nada -- a respeito deste livro que muito significou pra mim. Espero sinceramente que meus parcos e fiéis leitores sintam-se tão tocados quanto eu.

sábado, 14 de março de 2009

Maria-sem-vergonha

por Mônica Montone

Leila DinizDela ficou a imagem da menina que trepava em qualquer esquina com qualquer um simplesmente porque ela falava demais.

Quantas marias-sem-vergonha não se esfregam nos muros por aí, se fingindo de flor pequena e rósea, sem que ninguém saiba?

De sua boca não saíam apenas palavrões, mas também poemas que costumava recitar nos bares com um copo de chope nas mãos. Foi amiga de Manuel Bandeira, poeta que, aliás, a tirou do xilindró aos 15 anos de idade após uma prisão por atentado ao pudor por conta de um amasso na praia de Copacabana.

Achava as músicas de Edu Lobo tristes demais e, sobre os intelectuais, dizia: “São uns pentelhos, uns caras velhos. Intelectual não fode, fica só pensando, lendo”. Arrependimentos? Só o que deixou de fazer por neurose e medo.

Adorava crianças. Gostava de cachaça. Amava o mar. Escrevia em diários -hoje guardados com Marieta Severo: “Se a gente sabe das coisas, se vira, a realidade é um troço bacana”; “somando, subtraindo, dividindo, multiplicando, tanto faz. Me interessa o saldo”. Sonhava em ser mãe.

Não queria salvar o mundo, nem ser exemplo. Vivia o comportamento em época de engajamento. De seu affair não consumado com o rei Roberto Carlos, concluiu: “Se ele quiser, mesmo, que faça à moda antiga, toca a campainha do portão”.

Foi professora primária, vedete, atriz, jurada de programa de TV, dona de butique, esposa, amante, fugitiva da polícia, mãe.

Podia ter sido uma Maria qualquer se sua boca tivesse tramela, mas, como não tinha, foi o que não poderia deixar de ter sido: Leila Diniz.

Foi “todas as mulheres do mundo” em apenas 27 anos de existência e exuberância. Essa é a conclusão a que se chega ao ler sua biografia, escrita pelo jornalista Joaquim Ferreira dos Santos.

Ao longo das 286 páginas do livro, somos convidados a um mergulho na vida do mito Leila Diniz - que levou o Pasquim à extraordinária marca de 117 mil exemplares vendidos na edição com sua entrevista; que fez com que o ex-marido Domingos Oliveira rodasse um filme somente para tentar reconquistá-la e que foi rejeitada pela Rede Globo, pelas feministas, pela turma do Cinema Novo, pelos comunistas e pela polícia de direita, que a via como uma ameaça aos bons costumes. Mas além disso, reencontramos na biografia uma Ipanema que o tempo não pode trazer de volta e conhecemos histórias da menina que andava de maria-chiquinha e que na infância conversava com uma montanha que apelidou de ursinho Cherri.

A narrativa jornalística e repleta de deliciosos depoimentos faz com nos aproximemos ainda mais dessa bela dona que, por ter optado pela alegria, acabou se tornando um anti-ácido diante de tanta hipocrisia.

Se toda mulher fosse, mesmo, meio Leila Diniz, certamente o mundo seria mais feliz.


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